‘Gênero’, ‘não binariedade’ e ‘heterossexualidade compulsória’: a palestra de Marcia Tiburi na Petrobras

Professora de esquerda foi convidada para falar sobre ‘ética e gênero’ em evento restrito a funcionários da estatal no Dia da Mulher

Durante uma palestra na Petrobras, no Dia Internacional das Mulheres, a professora de esquerda Marcia Tiburi discursou sobre “ética e gênero” no teatro Edisen, no Rio. O objetivo da estatal foi ensinar os funcionários a “como se posicionar nos dias de hoje”.

Procurada pela reportagem, que interpelou o valor do cachê de Marcia, a companhia limitou-se a informar que “a contratação ocorreu conforme os padrões da empresa”. Um empregado da petrolífera disse que a quantia para atos semelhantes fica entre R$ 30 mil e R$ 40 mil.

Marcia Tiburi explica “glossário” de gênero

A docente tratou dos seguintes tópicos: gênero, binariedade, mulher/homem, heteronormatividade, estereótipo de gênero, identidade de gênero (trans, etc.) e “heterossexualidade compulsória”.

Em determinado momento, depois de perguntar aos servidores da empresa quem se enxergava como homem ou mulher, explicou a eles que, por muitos anos, a sociedade se dividiu assim, mas que agora essa dualidade já está “ultrapassada”.

“Vocês podem ficar superconfortáveis se, amanhã, já não estiverem mais tão bem situados nesse lugar aí onde hoje estão acreditando viver, no caso, homem e mulher”, disse Marcia à plateia. De acordo com a professora de esquerda, essa binariedade se construiu durante anos e significa uma grande “confusão”.

“Basicamente, nós somos o sintoma dessa tremenda confusão histórica”, observou. “Então, nos assumimos como ‘homens e mulheres’, que são horizontes construídos, naturalizados, e entramos num jogo de linguagem que nos faz sê-los, por meio da família, da Igreja e do Estado.”

Marcia explicou adiante os conceitos de pessoas trans e não binárias, as quais não se encaixam na nomenclatura-padrão dos gêneros. Este último grupo, porém, ao não se sentir bem com o idioma tradicional, adere à linguagem neutra.

A docente disse que o dialeto é “totalmente viável”. Em linhas gerais, uma forma de escapar da “heteronormatividade”, tida como antagonista.

Fascismo e “sistema de opressão” 

Enquanto discorria sobre o glossário, Marcia fez uma interrupção para discorrer sobre a classificação de uma “Escala F”, de “fascista”.

“São nove elementos de pontuação”, explicou, ao mencionar um indivíduo enquadrado como “fascista” nível três, que seria o adorador de um “líder autoritário”. “Ele gosta de ser submetido a um líder autoritário e gosta de praticar a violência autoritária contra outras pessoas”, afirmou, sem citar nomes.

“Mas um dos pontos importantes desta história é que todos os fascistas são extremamente preocupados e paranoicos com a sexualidade dos outros”, disse Marcia. “Eles não suportam a sexualidade dos outros em nenhum nível. Por isso, tanto controle e xingamento contra pessoas que não se enquadram na heteronormatividade.”

Suposta opressão do patriarcado

Marcia também comentou o machismo. Ao justificar a suposta opressão à qual o feminino é submetido na sociedade, Marcia fez um resgate histórico-geográfico, no qual retratou o homem como o “dono do campinho, do mundo, e as mulheres forjadas como o ‘outro’”.

“Então, se os homens eram o sujeito hegemônico, os donos do poder e do território, eles eram também essenciais, daí o seu lugar privilegiado (…) homens deveriam nascer; mulheres, não”, observou Marcia. “Quantas vezes aquela mulher que nasce vem com aquela impressão: ‘Ah, uma mulher, que pena!’? As famílias sempre consideraram os homens essenciais e prioritários.”

Conforme Marcia, há ainda a teoria segundo a qual a mulher é um “erro”, uma “fraqueza da natureza”, presente em correntes de pensamento, como a teologia.

“Vocês se lembram de um cara que chamou a filha dele como efeito de uma ‘fraquejada’?”, interpelou a docente, em alusão ao ex-presidente Jair Bolsonaro. “Isso é puro suco de fundamentalismo judaico-cristão. É um negócio feio para caramba, muito antiquado, ultracafona e tremendamente hediondo.”

Fonte: Revista Oeste